terça-feira, 28 de abril de 2015

Fadas - Do Literário ao Real




Titânia e Oberon - Sonhos de Uma Noite de Verão
Não é de hoje que a gente encontra pela net a fora centenas de artigos sobre fadas em seus mais diversos aspectos: sejam como seres naturais, como criaturas doces e meigas ou mesmo como espíritos tricksters. Há uma certa inclinação de algumas vertentes a considerarem as fadas como criaturas "bondosas", dada sua pureza. O que esquecemos é que pureza e bondade não são sinônimos e um leão não vai deixar de ser puro só porque te matou pra se alimentar. Rapadura é doce, mas não é mole não.
    A questão é que precisamos entender que os mitos feéricos possuem quatro momentos distintos, o primeiro deles nas lendas do povo Sidhe, o segundo na Idade Média, o terceiro na Era Vitoriana onde os mitos medievais foram ressuscitados e modificados de acordo com a mentalidade da época e o quarto é o que vivemos atualmente. No primeiro momento, as fadas eram vistas sempre como seres naturais totalmente amorais e guiados predominantemente pelo instinto, mesmo sendo dotadas de inteligência. Algumas possuíam atribuições, mas a maior parte eram simplesmente seres que interagiam com o meio natural mais ou menos como animais. Lendas como Leanan Sidhe, Baobhan Sidhe (Baobhan Sith), Bean Sidhe (Banshee), Bánánach, Brownies etc. mostram que em geral essas criaturas ou viviam para suprir sua fome por determinado tipo de energia ou exclusivamente para o fim para os quais foram criadas. Possuem inteligência e são até capazes de manipular, mas fazem isso de uma forma mais "mágica" do que propriamente usando de malícia ou de artimanhas, como alguns mitos associados as ninfas gregas.
No segundo momento, entramos numa era onde a Igreja se esforçava não só para extinguir culturas pagãs como também para demonizá-las. Nesse ponto, as fadas ganham sentimentos e um ar de "andarilhos". Predominantemente são associadas a figuras femininas e a maior parte de suas histórias costumam terminar em tragédias ou dramas amorosos. Temos nesse balaio folclórico lendas como as de Melusine, Murgen e Morgana (esse povo gosta de M hein...) mostram fadas mais humanizadas e sempre com um certo ar de realeza.
No terceiro momento, as fadas se tornam vilãs definitivamente. A Era Vitoriana, uma época de extremo conservadorismo na Inglaterra, tratou de deixar as fadas com um caráter trickster extremamente acentuado e de certa forma cruel. Lendas sobre círculos de cogumelos encantados onde as fadas raptavam pessoas e as devoravam, trocas de crianças humanas por bebês fadas, raptos de esposas poucos instantes antes do casório ou a morte de maridos por conta de fadas (agora também com aspecto masculino) enciumadas aterrorizavam o Reino Unido durante as noites de neblina densa. Isso provavelmente se deve a questão da recusa do ato de falhar, oriundo do comportamento da Rainha.
O quarto momento vira o quadro de maneira  drástica. As fadas idealizadas por Shakespeare em "Sonhos de Uma Noite de Verão" começam a ser resgatadas em forma de livros e contos infantis do séculos XX. Personagens sempre bondosos e dispostos a ajudarem crianças e necessitados de bom coração, em geral dotados de asas de insetos como libélulas ou borboletas. Nessa época surgem histórias como A Fadas do Dente, as fadas madrinhas dos Irmãos Grimm se tornam personagens muito mais maternais que as histórias originais, outras histórias infantis antigas narram fadas como heroínas em batalhas com feiticeiras más até chegarmos as "Sininhos". Fadas com pouco mais de 15cm (quando muito), corpo de mulher adulta e um jeito um tanto infantil e mimado, mas de bom coração.
O que acontece atualmente é que a parte das fadas como "seres amorais" foi quase completamente esquecida por muita gente e assim vemos várias tradições religiosas e covens tratando esses seres como se fossem criaturas pacíficas, amáveis e subservientes. Pois bem, algumas dicas sobre o assunto: Fada não é bichinho bonitinho que você agrada com Cupcake, elas podem OU NÃO aceitar a sua oferenda e se aceitarem, não significa que não vão foder com a sua vida. Lembrem-se, elas não amorais. Não existe pecado em sacanear quem te deu um belo prato de biscoitos de erva doce... É só brincadeira. Então, quer trabalhar com elas? Legal, mas não caia nessa de que elas são fofas e dóceis. A natureza NÃO É FOFA E DÓCIL e assim como um leão não deixa de ser um ser puro só porque comeu você, elas também não deixam de serem puras só porque resolveram  murchar todo o seu jardim de manjericão que você plantava a anos ou fizeram seu gato fugir de casa. Lide com isso.  
 


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